quarta-feira, 29 de junho de 2011

Linguisticamente possível, humanamente inviável

Foto/Reprodução: Instagram

k e g em em pares distintivos:
meu ego vive pelo seu eco...
Na verdade, traços distintos:
um cala. O outro grita.
Velar plosiva.

Alcançam o ápice quando:
não distinguem mais a diferença dêitica entre EU e VOCÊ.

Uma língua com complexo sistema de pronomes possessivos
Pode ser sua expressão pelo amor não-possessiva?

Ambiguidade dos pronomes na dêixis.
Um acordo fiduciário firmado
entre um surdo e um mudo.

Não estava no dicionário.
O que era significante?
Qual era seu significado?
Não havia consenso...

Sentença relativa com dois sujeitos.
Sujeito composto:
objeto subjetivado.
Sujeito oculto:
sujeito objetivado.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Mãe



Sabe aquele cheiro que sobe da máquina de algodão doce? De açúcar quente? Cheirava isso. Nessa época não se atentava em definir as coisas. Não entendia bem as coisas. Não definia nada, não conhecia o conceito de nada. Eram apenas sensações e verdades. Ela cheirava algodão doce. Pensava que nuvens eram doces também. O sorriso dela lhe fazia cócegas. Descobriu a primeira forma de amor. A única forma altruísta.

Amor é algo que se constrói com o tempo e pra que ele aconteça é preciso que de alguma forma as pessoas sejam feitas da mesma substância. Uma substância indefinida, impalpável. É uma substância tão abstrata que mesmo que a pessoa deixe de existir, na sua mente ou no mundo, a sensação é permanente, como uma tatuagem dentro de si. Um amor por si próprio que reflete numa imagem diversa no mundo. Você deixa de se amar quando ele não tem mais onde refletir. Temos de volta aquilo que damos ao mundo.

Ver um amor crescer é a única experiência que vale a pena nessa passagem. Existe apenas um motivo pelo qual existimos, o motivo que desconhecemos, que não mensuramos e não definimos. Todo o resto é mentira. Apenas o que você sente é uma verdade. Verdade mutante, mas verdade. O cheiro do algodão doce, é mais que uma verdade ou uma sensação, é um fato. O cheiro do açúcar quente quando sobe da máquina te eleva aos céus e te põe pra dormir nas nuvens. Comer o algodão doce, que de tão doce, repuxa suas bochechas por dentro, te provoca cócegas. Uma felicidade apenas por degustar um algodão doce. Só isso é verdade. Todo o resto é mentira. Tudo que é passível de definição e conceitos é mentira. Se perde no tempo e não faz sentido pra quem não o vive. Só o que sentimos é um fato, só um fato é verdade: as pessoas só precisam de amor.

Só é possível aprender a amar com uma pessoa. Que você reconhece o cheiro de olhos fechados. Que te acalma nos piores momentos com qualquer palavra, porque o que importa é a voz, e não as palavras. Que não precisa dizer nada, sequer te tocar, mas que você se sente protegido apenas por estar perto. E por mais que esteja distante de você no mundo, reflete o seu amor, a sua esperança e a sua expectativa com relação a tudo. A máquina de algodão doce. O doce que nunca amarga. O único doce que é tão macio e quente como de onde você veio, o único lugar que você quer estar em qualquer extremo, seja de felicidade ou de tristeza. A literal definição de partilha, porque somos um só.

E o que fazer quando sentimos isso? Quando procuramos definições e elas nos levam a uma única palavra: amor? É hora de cheirar como a algodão doce...

terça-feira, 14 de junho de 2011

Sobre a Saudade

Foto/Reprodução: Instagram

Gosto de pensar sobre o significado das palavras... Saudade é uma palavra que me intriga. Primeiro, porque há inúmeras definições e nenhum consenso (como todo sentimento). Segundo, porque sua transliteração em outros idiomas trazem semas extremamente divergentes de cultura para cultura, como se fosse algo totalmente diferente de ser humano para ser humano. E finalmente, porque quase sempre está associada à falta.

Penso, que sim, não há porque haver consenso. Porque a saudade é a própria falta. E a falta que cada um sente é a falta que lhe cabe. E daí, jamais será a mesma pra qualquer um. Talvez seja a sensação de estar plenamente vazio. Vazio de lembranças. De esperanças. Inteiro. Inteiramente incompleto. Estranhamente feliz, estranhamente leve. Como uma brisa que traz uma poeira que é deixada e trazida a cada metro percorrido. Como uma poeira que vira lama. Como uma poeira que cega. Como uma poeira que assenta. A mesma poeira, mas com uma capacidade imensa de transformação. Mas ainda assim, ser a mesma poeira.

A saudade é aquilo de tudo que restou antes que se fosse, já não nos lembramos mais do que gostavávamos de lembrar. Fica apenas uma indefinição. A mesma indefinição de antes de ter existido. Antes podia ser. Agora, já não é mais. A saudade é sempre o buraco da alma que a gente procura alguém/algo pra nos habitar. O erro é sempre associar a saudade a um objeto no mundo. Não! A saudade é apenas falta. Falta daquela poeira que é você mesmo, que hora é lama, hora cega, e hora assenta. É por isso que rostos se apagam com o tempo e cheiros permanecem...

Penso que saudade é fome, ausência é que falta de apetite. Na falta de sentido, pra que se alimentar? Saudade... come-se na esperança de sobreviver até preencher a falta. Falta de algo que existe. A falta é o que nos faz caminhar. É a certeza de que há algo bom pra nos habitar. Ausência não. Ausência é o não existir. Aquilo que não dói, mas também não abre o apetite. É ausência da própria falta. Ser completo. Completo de não ter porque se alimentar. Completo de falsas completudes.

A saudade só vem daquilo que é reciclável. De tudo que se vive, há sentimentos que são tão inutilizáveis que são como lixo orgânico. Fedem. Inapropriados. Inaproveitáveis. A vida é uma coleta seletiva. O tempo todo juntando restos do que valeu a pena. Do que pode ser reaproveitado. Do que vale a pena ser revivido. Revivido apenas em sua essência, mas em outras formas, outras cores, outros lugares. Essa é a magia e o porquê de tudo acabar.

A saudade é isso, apenas essência de alguma coisa. A sensação que nos causou. Onde, quem, quando e como são apenas definições. A marca de fato, é o que você não define. É o que você traz, sem saber de onde, de quem, porquê, antes mesmo que algo existisse. É a falta, é o que te move. É um suspiro, uma intenção, uma intuição, um não sei porque mas vou me atirar na lama, deixar que a tempestade me cegue até que a poeira se assente, e eu comece tudo novamente.