segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A colheita

Não há escolha sábia das uvas para o melhor vinho. Processos mecanizados na produção do vinho não fazem diferença no tilintar de uma noite fria... Nem sempre as mais belas uvas servem o mais fino vinho.

A colheita ja é, na verdade, uma etapa posterior a várias outras etapas iniciais, como o preparo de si próprio, a escolha do terreno a se frequentar... Você colhe e coleciona figurinhas e monta seu próprio "ideal". A partir deste ideal, seleciona possíveis videiras onde encontrá-lo. Mas nem sempre as melhores uvas produzem o melhor vinho. Há tantas etapas e transformações envolvidas que você não pode controlar... e quando menos espera está entorpecida e flutuando com um vinho barato ou com um gosto de guarda-chuva na boca com um Cheval Blanc 1947.

Dizem que como a uva possui enorme influência sobre o sabor do vinho, a colheita precisa ser feita no tempo certo. Uma colheita prematura resulta em um vinho aguado, com baixa concentração de álcool enquanto uma colheita tardia, produz um vinho rico em álcool, mas com pouca acidez. Qual é o tempo certo? O solo há ainda de influenciar nas uvas, e por consequência no vinho...

Sim, você tem acesso a bons vinhos procurando por marca e safra. Mas a quintessência do vinho depende mais do que sua escolha, mais do que um processo perfeito de fabricação. A quitessência está muito mais relacionada a ser escolhido, a se deixar entorpocer e se envolver numa química que você próprio não explica e que nenhuma análise laboratorial minuciosa seria capaz de desvendar.

E assim é, você procura a perfeição mas descobre que a perfeição é monótona. A paixão realmente lhe pega pelos defeitos, descobre que é a acidez do vinho que o faz gostar do doce do vinho. Porque se o vinho fosse apenas doce, em apenas um copo você enjoaria. Descobre que a pressa estraga tudo...estraga o gozo, estraga a espera. Um vinho aberto antes da hora não embebeda, uma uva colhida antes da hora não fermenta... Um vinho passado do tempo vira vinagre, amargo como lembranças engavetadas de uma história que jamais pode ser.

Enquanto o vinho está confinado em barris e você não tem o poder de escolha, resta embriagar-se com outras bebidas pra que o copo não fique vazio. Você experimenta enquanto isso marcas chulas, vinhos que não entorpecem, outros apenas pelo rótulo... Enquanto o tempo não lhe permite tomar o vinho certo as coisas são mais fáceis. Duro é a hora de virar o último gole ou abrir a primeira garrafa. Girar o vinho na taça e sentir seu aroma... ah! a espera... Fechar os olhos e aos poucos virar aquela taça que você saliva de imaginar o sabor nunca provado... Enfim toca sua língua, e nesse momento você descobre que não pode mais viver no mundo real. Bem-vindo ao mundo de Dionísio...

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